quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

O mundo sem mim...



Estamos nós aqui: integrados à vida, ao mundo natural, numa relação de dependência: ar, água, alimentos. Precisamos da natureza para sobreviver. Chegamos inacabados, dependentes de muitos cuidados. À medida que crescemos vamos nos desprendendo, de nossos cuidadores, nos individualizando.

Adolescentes desejamos a liberdade , e o sopro de um sentimento de soberania começa a nos envolver. Nos supomos donos do saber, nos achamos “excelentes”. Sabemos o que é melhor para nós: nossos pais nada sabem. Sabemos o que é melhor para nossos amigos: eles estão “por fora”. À medida que avançamos enlouquecemos um pouquinho, a cada dia, enquanto nos tornamos a "essência" do mundo.

A existência é curta, rápida! O jovem não sabe disso, não pensa nisso. A ignorância é, sem dúvida, benéfica em vários aspectos e este é um. Essa ignorância reflete a sabedoria contida na vida, ao programar nosso desenvolvimento psicológico. Não é bom pensar na morte quando se começa a viver. O ideal é pensar que temos todo o tempo do mundo, para fazer mais tarde, o que deixamos pra depois.

Geramos filhos. Nascem-lhes os primeiros dentinhos e não vemos, os primeiros passos são dados, ditas as primeiras palavras e a babá é quem recebe esses presentes que são nossos, porque, no momento, estamos cuidando do que “importa”, alimentados pela ilusão de que o mundo não subsiste sem nós, e de que teremos tempo para o resto.

Nos metemos no maior corre-corre, enquanto coisas essenciais são deixadas de lado. Em primeiro lugar está a empresa, que não é nossa, mas que não sobreviverá sem nós, o escritório, o consultório, o hospital, os amigos, a igreja, a comunidade, as comemorações, confraternizações... Que seria do mundo sem nossa presença! Somos necessários!

Chega a hora de partir (chega para todos), a vida é realmente curta... Nos vamos, mas ela segue adiante. A empresa continua a lucrar, outros profissionais se ocupam dos nossos clientes e pacientes. Amigos encontram outros amigos, a igreja outros líderes e fiéis, a comunidade outras pessoas. E as festas? Vão Continuar ótimas! Animadíssimas! Mesmo nós não estando lá...

Não somos a essência da vida, o mundo continuará sem nós... sem mim...

Não é uma coisa boa para se pensar, é melhor viver acalentado pela ilusão da nossa “importância” ilimitada, mas refletir sobre isso não deve nos deixar tristes ou deprimidos, deve sim nos tornar atentos em relação aos que realmente precisam de nós, do nosso afeto, da nossa presença, sorriso, atenção, amor. Para estes, somos essenciais sim, mas eles, até eles, continuarão sem nós...

Quando partirmos, na mente dos que nos amam, seremos uma lembrança, e conforme o modo como os tocamos no coração e na alma, se lembrarão dos bons momentos juntos, dos risos, do nosso riso, da nossa bondade, da nossa alegria, e das palavras ditas por nós, que contribuíram para elevar-lhes a autoestima.

O mundo continuará sem nós, mas poderemos viver um pouco mais nas mentes das pessoas amadas, que esboçarão um leve sorriso ao lembrarem-se do nosso riso, da nossa alegria e do quanto foram felizes conosco.

Digo-vos que não sabeis o que acontecerá amanhã. Porque, que é a vossa vida? É um vapor que aparece por um pouco, e depois se desvanece. Tiago 4.14

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Somos únicos



Cada pessoa diante de nós, é muito mais do que somos capazes de ver, é uma riqueza imensa, um conteúdo de vivências familiares, afetos, idéias, valores, fantasias mescladas de realidade, conceitos e preconceitos.

Independentemente da condição social, assim é construída a subjetividade humana. Somos seres complexos e toda essa complexidade leva cada um de nós, por vezes, a ter uma visão distorcida da realidade que nos cerca, não apenas da nossa realidade, mas da realidade que concerne ao outro.

Nossa visão distorcida nos faz errar ao tecermos opinião sobre um outro, do qual conhecemos a superfície.

Pior ainda, quando baseamos nossa opinião no depoimento de outra pessoa, quando não paramos para questionar, avaliar o que ouvimos e aí nos tornamos injustos, julgamos sem conhecer - gostamos se o outro gostou, mas porque gostou? Não gostamos porque o outro não gostou. Baseado em que?

Nós perdemos por não conviver, conhecer alguém que talvez tivesse muito para nos acrescentar, de suas vivências e experiências.

Nada podemos opinar sobre um livro que não lemos. Não podemos julgá-lo pela capa, precisamos lê-lo até à última página, nem que seja para afirmar: “li e não gostei”, o que não impede , é claro, que outros leiam e gostem. Como um filme do qual não gostamos, à vezes porque não pudemos alcançar a mensagem nele contida, mas quem entender vai gostar.

Cada pessoa é um livro a ser lido, página por página. Com interesse e atenção para apreender o conteúdo, podemos descobrir preciosidades, riquezas que só pertencem aquele indivíduo, histórias de risos e lágrimas, de dor e superação, amor e desamor, histórias que o transformaram na pessoa que é.

Entretanto, pessoas são pessoas e livros são livros, estes podemos encontrar muitos sobre o mesmo assunto, já pessoas são únicas. São como uma edição de um só e valioso exemplar. Raríssimas e preciosas.

Pobres de nós que às vezes nos esquecemos do quanto são preciosas as pessoas com as quais convivemos, aquelas que amamos, mas que num dia qualquer podem se ir de nós, porque estamos de passagem.

O desconhecido nos assombra, sejam pessoas ou outra coisa, como a morte, isso porque alimentamos a ilusão de que temos o controle do conhecido, entretanto não controlamos nada, não conhecemos nada, nem a nós mesmos.

Quem sabe como vai se comportar num assalto? Ninguém sabe. Em cada um de nós existe o misterioso inconsciente que em momentos inusitados assume inesperadamente o controle de tudo e agimos de forma inesperada, o que significa que há um desconhecido em cada um de nós, capaz de nos trair e jogar por terra tudo o que pensamos ser.

Um desconhecido com poder de desconstruir as nossas verdades sobre nós mesmos, no exato momento em que somos pegos por qualquer inusitada circunstância da vida.

É esse desconhecimento que nos desautoriza a julgar o outro apenas pelo que pensamos conhecer, porque o que vemos pode não ser como que parece, assim como não somos do jeito que aparentamos ser.