quarta-feira, 30 de setembro de 2009

A culpa é sua!



A culpa é sua!

Proteger-se da angustia culpando os outros é uma tendência humana. A culpa faz com que nos sintamos incapazes, insuficientes, inadequados e por isso a evitamos. Culpar os outros é uma defesa inconsciente, e quando alguém diz que a culpa de seus fracassos é do outro, não está mentindo, realmente acredita nisso. Culpar o outro é proteger-se desviando o foco de si para o outro, que se torna alvo de críticas e projeções.

Muitas vezes nas famílias, alguém, às vezes uma criança ou adolescente, é, inconscientemente, “escolhida” para ser o foco das projeções de todos os outros, e se torna o “culpado” por tudo o que acontece de errado em casa, culpado por todos os infortúnios e mazelas. Na verdade, enquanto os olhares estão naquela pessoa, e todas as críticas são dirigidas a ela, os outros podem ocultar sua insuficiência. Isso também ocorre nos casamentos. É comum um cônjuge culpar o outro pela infelicidade do par, apontando no outro, falhas ou defeitos, enquanto assume o lugar de vítima.

Quem não se solidarizou com Nelsinho Piquet, quando no lugar de vítima, se disse forçado por Briatore e Symonds a provocar um acidente no GP de Cingapura-2008? Se o carro estava nas mãos do Nelsinho, ele tinha escolha. Por que escolheu bater e depois culpou Briatore?

Estamos sempre fazendo escolhas, mas nem sempre queremos assumir as conseqüências das escolhas que fazemos e culpamos os outros. Na vida social ou familiar, em todas questões há sempre dois lados e em ambos pessoas envolvidas. Onde houver pessoas haverá diferentes modos de pensar, erros e acertos, e cada uma tem a possibilidade de verificar como contribuiu para a ocorrência de determinada situação conflituosa.

Verificar qual a minha contribuição para uma determinada situação requer uma pausa para olhar dentro de mim mesmo, descobrir minhas verdades, me conhecer. Quem sabe a culpa não seja do outro? Pode ser minha! Mas para admitir terei que abrir mão do meu narcisismo e com uma boa dose de humildade assumir que errei.

Saber admitir a própria culpa requer saber lidar com o desconforto de se descobrir um pouco incapaz, um pouco impotente, um pouco sem razão.

Ora, isso não é tudo! Há muito mais em cada um de nós em valores e qualidades que possibilitam aceitar um pouco de desaprovação sem nos sentirmos inadequados para a vida. Isso diferencia o adulto da criança.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Casar é ser feliz ou fazer o outro feliz?


Os dois se casam cheios de vida, de esperança e sonhos, vivem plenamente a alegria de estar juntos até que um dia se dão conta de que já não se entendem mais, e seguem tentando descobrir onde erraram, onde as esperanças se perderam, aonde o sonho acabou.

Pareciam ter sido feitos um para o outro, combinavam em tudo: gostavam das mesmas coisas, riam das mesmas piadas, curtiam a mesma música, tinham tantos assuntos em comum e agora quase não se falam mais, qualquer conversa termina em discussão. O que aconteceu com eles? Em que mudaram?

Não mudaram, sempre foram os mesmos: com personalidades próprias, modos particulares de ver a vida, idiossincrasias, histórias de vida, bagagem cultural adquirida na família de origem, conflitos pessoais, qualidade e defeitos, foram para o casamento na expectativa de tornarem um, mas lá chegando descobriram que são dois e não podem funcionar como um, pois são diferentes, quase incompatíveis.

O casamento adoece quando um dos cônjuges, rejeita as diferenças e quer, mudar o outro, colocá-lo numa forma, forçá-lo a agir segundo um padrão de funcionamento diferente, na ânsia de tornarem iguais. Não somos iguais, somos diferentes, temos personalidade, temperamento, modos de pensar, sentir e agir diferentes e é essa diferença que enriquece a vida e os relacionamentos.

Algumas pessoas se casam na expectativa de se tornarem pessoas felizes ou para fazer o outro feliz. Casar para ser feliz, é entrar no casamento para sofrer, porque entra trazendo uma demanda de felicidade dirigida ao outro, que não lhe pode atender, não que não queira, mas que não pode, porque não lhe compete, pois quem era infeliz antes de casar vai continuar infeliz depois do casamento, pois sua expectativa de felicidade ou está vinculada a uma história infeliz que trouxe na bagagem, ou a um modo particular de ver a vida, que não se resolverá casando-se.

E quem se casa para fazer o outro feliz, ignora que ninguém tem o poder de fazer alguém feliz. Podemos fazer alguém sorrir, podemos alegrar alguém com um presente, um passeio, um elogio, mas felicidade é algo pessoal, transcendente, vinculado à subjetividade de cada um. Todos nós temos uma história de vida, determinante do nosso modo de sentir, viver, perceber as situações à nossa volta, enfim, lidar com a realidade, por isso felicidade é algo pessoal, um modo particular de ver a vida, encarar os fatos, vivenciar aspectos positivos e negativos que deparamos no dia a dia.

Casar é compartilhar, ou seja, dividir ou repartir, não é, necessáriamente fazer coisas juntos, aliás, muitas vezes é deixar que o outro faça o que tem que fazer sozinho, é permitir ao outro respirar. Compartilhar também não é ter o mesmo modo de pensar, mas entender que o outro tem direito de pensar diferente. Não é ter o mesmo sentimento, porque o outro sente de outro modo, conforme suas vivências, e o que toca profundamente um, pode não ter o mesmo significado para outro.

Compartilhar é colocar sobre a mesa o que se possui: qualidades e defeitos, semelhanças e diferenças, pontos fracos e fortes e constatar que o casal é igual apesar das diferenças: igual nas fragilidades, igual nos medos e angústias, igual no desejo de receber amor, igual na impossibilidade de satisfazer plenamente o outro, e que, apesar de tudo, cada cônjuge pode compartilhar, para o bem do casamento, o melhor de si.

Compartilhar é dividir ou repartir compreensão, respeito e aceitação. O melhor que um cônjuge pode fazer em favor do outro é compreender que o outro é limitado, é respeitar suas limitações e aceitá-lo apesar disso.

Compartilhar compreensão, respeito e aceitação é amar, e amar assim é ser e fazer feliz.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Questões familiares



Questões familiares

A instituição familiar foi palco de uma série de mudanças nos últimos anos. A organização antes predominantemente patriarcal, perdeu a sua forma diante das novas configurações que surgiram como resultado das rápidas mudanças dos valores sociais. Essas mudanças nos põem diante de arranjos familiares antes improváveis. Os laços conjugais deixaram de ter a duração de antes e, facilmente desfeitos hoje, permitem a abundância de núcleos familiares diferenciados.

Há famílias formadas por casais que tanto o homem como a mulher, têm filhos de casamentos anteriores que convivem juntos na mesma casa e, em alguns casos com os novos filhos que surgem da nova união. Há núcleos compostos por mãe e filhos ou por pai e filhos, constituindo famílias monoparentais, núcleos originados das chamadas “produções independentes”, podendo essas produções ser femininas ou masculinas, como é o caso do cantor Ricky Martin, que tem filhos gerados numa barriga de aluguel e que vivem com ele apenas, sem a mãe. Há famílias formadas por pares homossexuais que adotam crianças, além de outras novas possibilidades de formações que surgem a cada dia.

Qualquer que seja a formação, entretanto, é real e verdadeiro o desejo da manutenção do vínculo familiar, tarefa essa que demanda determinação e criatividade. Estar incluído em um grupo familiar e social é fundamento necessário à aquisição, pelo sujeito, de conteúdos estruturantes da sua personalidade.

A criança assimila tanto a história familiar, quanto o discurso inconscientemente organizado, no sentido de transmitir e preservar a imagem da família. Cada criança que “estréia” em um grupo familiar torna-se um elo de uma cadeia pré-existente e nesse lugar, onde não escolheu estar, será construída a sua subjetividade não só a partir do que herdou dos seus ancestrais, mas também do que capta, não só de forma consciente, mas principalmente inconscientemente no enredo que se desenrola na trama familiar.

É cada vez maior a importância do tempo para dialogar, nesta sociedade que vive com pressa e faz da família uma entidade sem tempo para conversas. Dialogar é escutar e não simplesmente ouvir, é compreender, esclarecer, acolher, trocar idéias e informações, dissipar dúvidas. O percebido ou captado captado no seio familiar, ganha contornos delineados pela imaginação da criança, se transforma em “verdades” tecidas nas fantasias da mente infantil, podendo vir a se transformar em conflitos emocionais, assombrar suas vidas e modelar suas decisões.

É a incerteza e relatividade das relações familiares, aliadas às exigências da vida atual, que aumentam a angústia dos sujeitos, aprisionando-os a uma insatisfação constante. Não é por acaso que vemos aumentar o índice de criminalidade, violência, uso de drogas e alcoolismo entre os jovens e adolescentes.

Ackerman em Diagnóstico e tratamento das relações familiares, (artes Médicas, 1968, p. 32) escreve: “Basicamente, a família tem duas funções: assegurar a sobrevivência física e construir a humanidade essencial do homem. A satisfação das necessidades biológicas é essencial para a sobrevivência, mas a simples satisfação dessas necessidades não garante de forma alguma o desenvolvimento das qualidades de humanidade.

A qualidade de humanidade está descendo a níveis cada vez mais baixos, e tende a piorar se não houver, nas famílias, um amplo investimento afetivo, que possibilite segurança emocional baseada num discurso coerente e firme. A carência de firmeza nas relações entre pais filhos tem contribuído para gerar, em escala crescente, superegos fracos, ou seja, pessoas que não internalizaram regras e limites, seres sem compaixão.

A falta de regras e limites internalizados, traz as conseqüências sociais que vemos refletidas no aumento da violência urbana em todos os seus aspectos: Violência não só contra a vida, mas também no trânsito, nas escolas, explícita no desrespeito pelo direito e espaço do outro, e também, no uso abusivo de drogas, que é uma violência contra si mesmo.

Os novos arranjos familiares são uma constatação irrefutável, e muitas das pessoas chefiando famílias, pegas de surpresa pela velocidade das mudanças sociais, não perceberam que é da família a responsabilidade de transmitir aos “recém chegados” os valores e normas que dão suporte à convivência social.

É a família que prepara o individuo para o exercício da plena cidadania na vida social. Investir tempo nessa preparação é condicionante para dar segurança emocional, evitar desprazeres oriundos da quebra das normas sociais, além de reforçar e cimentar o vínculo afetivo do grupo familiar.